O Brasil, citado em 2023 como 19º colocado em acesso de qualidade ao sistema de saúde pública, segue como um dos países com o maior número de novos casos da doença, atrás apenas da Índia. Em 2024, foram registrados 22.129 casos no país, o que todavia nos traz o “benefício da dúvida” , quando idosos podem ter sido jovens subnotificados.
Mas que brumas escondem o desenrolar e a persistência da Hansen em nossa sociedade, ainda com status de moléstia ligada a vulnerabilidade social? Ao retornarmos no tempo, manchetes da primeira metade do Sec. XX, referem-se a “lepra”, em um momento de transição de políticas públicas, como a Lei Federal nº 1.045, que abordava a concessão de alta aos doentes. O isolamento compulsório em hospitais -colônia, O uso do recém-descoberto antibiótico Dapsona , traz a necessidade da percepção real da doença.
O custo da doença, as questões estruturais e o apoio da mídia e da Igreja da época, mostrava que apesar da mudança na abordagem, relatos e fotografias da época, como os consultados em pesquisa sobre o Maranhão, Ceará, Paraíba e Santa Catarina, mostram o cotidiano e as condições de vida das crianças e adultos internados. A realidade de abandono dos internos e das próprias instituições seria posteriormente denunciada em matérias jornalísticas de décadas futuras, com base em registros fotográficos e documentais.
Ao retroagirmos mais ainda no tempo, a análises de periódicos como o cearense O Nordeste, fundado em 1922, traz o flagelo da ainda “lepra”, e a ameaça do “convívio” nas capitais como Fortaleza e Rio de Janeiro, noticiando frequentemente o drama dos “morféticos” e cobrando ações enérgicas do poder público. A tônica dessas reportagens é a necessidade de isolar os doentes para distanciá-los do contacto com os sãos, pois o isolamento compulsório era considerado a única medida eficaz de profilaxia na época. E com isso, campanhas para construção dos ditos leprosários, conclamando a iniciativa privada e a sociedade civil, tornam-se comuns, e são frequentemente. Jornais de São Paulo, por exemplo, relatavam as condições e o número de leprosos abrigados em hospitais da província. O Hospital dos Lázaros em Sabará, Minas Gerais, construído em 1883, também seria um exemplo de investimento na época.
Todavia, senhoras e senhores, hoje, século XXI, ainda somos o destaque mundial de casos. Mesmo com tecnologia diagnostica (testes rápidos gratuitos) e tratamento (combinação de três medicamentos, rifampicina, dapsona e clofazimina, eficaz na cura e na prevenção de incapacidades físicas. Porém, questões como diagnóstico tardio e a pandemia da COVID -19, que afetou a detecção de novos casos, resvalam ainda na pior das heranças: preconceito, vulnerabilidade, estigma social, que por sua vez incidem no primordial: diagnóstico e tratamento.
Por Andrea Tavares, coordenadora do curso de Enfermagem do Centro Universitário UniFBV Wyden
*Via Assessoria