Cinema São Luiz

Por Baixo do Teto de Ouro

 

Depoimentos dos que viveram os bons tempos com o velho São Luiz

Entre as décadas de 1970 e 1980, um oficial da justiça ficava na entrada do cinema. Existia a censura pelo conteúdo político não só nas histórias dos livros e nas entrelinhas das músicas, mas também na sétima arte. Os filmes influenciaram os jovens, principalmente os filmes de arte, que transmitiam implícita ou explicitamente o cotidiano dos países que aderiram ao comunismo.

Inserido nesse contexto, Antônio Arruda, de 48 anos, que mora no bairro de São José desde que nasceu e juntamente com amigos da família Santos, também enraizados no bairro, eles conheceram o São Luiz em uma época de auge e repressão. Famílias tradicionais como a de Arruda e a de Antônio Sérgio Santos, de 56 anos, fizeram parte da histórica dos movimentos culturais que neste bairro foram criados. Arruda ainda lembra muitos filmes que assistiu no São Luiz e relembra alegremente das presepadas que aprontou dentro do cinema.



Com um grupo de amigos, ele relata que a sensação e brincadeira da época era ir ao cinema e junto com ele levar um saco de risadas, além de amigos e namoradas, ele também freqüentava o espaço com a família. “O São Luiz era um cinema de primeira classe, as pessoas eram bem tratadas, iam elegantes, meu pai já chegou a ir de terno para assistir uma sessão”, confirma Arruda que confessou falsificar documentos para poder entrar na sessão da meia-noite, pois a sessão era para maiores de 22 anos. “A sessão da meia noite era a pré-estréia, como o Inferno na Torre, um filme que gostei muito. Além da sessão da meia-noite, eu ia aos sábados às 10 horas da manhã para a sessão matinê.”

Árduo cinéfilo, Arruda assistia as sessões e fazia a sua própria sinopse em suas anotações particulares. Listava os filmes e entre eles escolhia os melhores do ano. “Assisti Lua de Papel, que é em preto e branco, vi a apresentação dos Trapalhões na estréia do filme Os Trapalhõe s”, eventos que nem sempre continuaram a acontecer. Ele concorda com a idéia de que um dos mais antigos cinemas de rua volte a funcionar, porém acredita que só obterá novamente o seu auge se o São Luiz tiver projeções “que levem alguma mensagem para o seu povo”.

Outras recordações desse cinéfilo eram os trailers e comerciais, que na época era chamado de “natural”. A natural era iniciada da seguinte forma, primeiro se apagavam parcialmente as luzes, em que as luzes do fundo ficavam acesas durante os comerciais e após a exibição da “natural” tinha o apagão geral para que o filme se iniciasse. Esse era o termo usado entre ele e os amigos que também fizeram parte da rotina.

Apesar de ser hoje uma das partes mais chatas do cinema, a “natural”, naquela década de 1970, era também esperada pelo público, em que nelas passavam notícias da semana e o tão esperado lances do futebol nacional e pernambucano, pois era a década em os brasileiros estavam vidrados na copa e Pelé virado no placar.

Antônio Sérgio Santos, que também viveu essa história e muitas outras com Antônio Arruda, conhece muito bem os cinemas que freqüentou como o Cine Glória, o Cine Ideal, no Pátio do Terço, o Cine Boa Vista, na Praça Chora Menino, o Cine Afogados, no largo da Paz, sentou-se também nas poltronas do Cinema Central e do El Dorado. Sem contar que Sérgio esteve na inauguração do cinema Veneza, com a estréia do filme Aeroporto 75, em que o mesmo chegou a participar do coquetel por que conhecia o porteiro do cinema.

Com toda essa ativa participação no cenário cinematográfico de Recife, Sérgio salienta que o “Cinema São Luiz, foi a melhor sala de exibições da Região Metropolitana” e chega a afirmar que “do Estado foi a melhor sala da história do cinema”. Porém para ele a reabertura do São Luiz não só depende das projeções e sim de um conjunto de outras obras, “tem que melhorar o policiamento local e expandir o transporte público”, compara os dias atuais ao de sua adolescência. “Se antes existia um oficial de justiça para fiscalizar e monitorar os jovens, hoje deveria ter policiamento para assegurar o cidadão”.

A invenção e expansão dos grandes shoppings Center, o conforto e praticidade que os mesmos oferecem para os seus clientes, fez com que muita gente esquecesse ou até mesmo fugissem da violência do centro da cidade. A irmã de Sergio Santos, Nádia Santos, também tem boas recordações do São Luiz, assistiu a Noviça Rebelde com seu pai e lamenta não ter tido a mesma tranqüilidade com sua filha, ao esperar aflita e preocupada com os “meninos de rua” pela sessão de Homem Aranha 2.

Na década de 1990, um dos grandes sucessos que o São Luiz projetou foi o filme norte-americano Titanic. Em 1997, no final de semana de sua estréia, Titanic arrecadou 28 milhões de dólares, sendo um dos filmes recordistas da época. Centenas de pessoas esperavam sessão após sessão para assistir o filme. As filas rodeavam o prédio Duarte Coelho, tanto de um lado como do outra da bilheteria.

Uma das criadoras e editora do portal cultural recifense Boi Voador, a jornalista Elayne Bione, de 23 anos, espanta-se quando o assunto é relembrar o Cinema São Luiz: “Frequentava pouco, convivi mais quando eu era criança. Minha mãe me levava sempre para o Cinema Veneza, que também me recordo vagamente”. Para Elayne, a melhor notícia sobre a reabertura do São Luiz é que o cenário pernambucano estará em pauta. “A melhor noticia sobre a reabertura do cinema é que vão ter sessões com produções pernambucanas. É a atitude certa. Melhor do que exibir os filmes que já têm espaços nos shoppings”. Apesar de não ter certeza do último filme que assistiu lá, ela guarda uma lembrança característica do São Luiz, “tenho recordações de como era bonito por dentro e das músicas clássicas que escutava antes das sessões”.

Em pleno século XXI, o sonho de quem quer viver no mundo da arte talvez seja o Rio de Janeiro ou São Paulo, pois lá estão concentradas as mais populares e maiores produções do Brasil. Porém a carioca Wanessa Miquilino veio à Recife para se lançar no espaço do audiovisual porque o sudeste se encontra saturado. Wanessa tem expectativas de que Recife poderá resgatar o movimento cinematográfico que já teve antes. Hoje, com 29 anos é diretora de arte da Migus Comunicação e há 3 anos, no dia 06 de fevereiro de 2006, desembarcou na capital e viu na cidade uma oportunidade de sucesso. Não chegou a entrar no São Luiz, contudo em questões de história do cinema regional, ela tem orgulho em afirmar que Recife é um marco no cinema nacional. Apesar de ter ofuscado o seu brilho durante o Ciclo do Recife, na década de 20, e no movimento Super 8, na década de 70, a Veneza Brasileira é de fundamental importância e o cinema São Luiz e um grande fornecedor. “Ele trazia um movimento cultural, artístico, para cidade. Com a sua reabertura os jovens de hoje poderão ver um dos mais belo e tradicional cinema do Brasil”, afirma Wanessa.



Primeiros Cinemas de Recife até o São Luiz

No ano de 1968 existiam quase 101 cinemas espalhados por Pernambuco e só em Recife se aglomeravam 28, que em sua maioria eram concentrados no centro da cidade. Confira alguns na linha do tempo:

1909:

Cinema PathéO primeiro cinema do Recife possuía 320 cadeiras e um camarote para autoridades e pessoas importantes. E era localizada Rua Nova (antiga Barão da Vitória), nº 45.

Cinema Royal – Um pouco menos de quatro meses após o surgimento do cinema Pathé, nasce o segundo cinema de Recife. Também localizado na Rua Nova, n° 47.

1910

Cinema Helvética – Além de filmes, também apresentava peças teatrais e consertos musicais. Viveu na rua da Imperatriz.


1911

Cinema Polytheama – Localizado na Rua Barão de São Borja, que em 1932 passou a pertencer à empresa de Luiz Severiano Ribeiro.

Cinema Siri – Um cinema que apresentava na Praça da Independência, no centro da cidade, ao ar livre suas sessões.

1913

Teatro Santa Isabel – Foi a partir de 1913 que o teatro Santa Isabel também aderiu à moda do século, exibindo em melhor qualidade as películas e sendo considerado o melhor cinema da região. O Santa Isabel também ganhou fama pela luxuosidade que oferecia e ficou conhecido nacionalmente como o cinema mais confortável e higiênico do Brasil.


1915

Cinema Moderno – Dois anos antes era apenas o teatro do bairro de Santo Antônio.

Cine Ideal – Localizado no Pátio do Terço com 250 assentos de primeira classe e 217 de segunda classe.

1921

Teatro do Parque – localizado na Rua do Hospício, nº 81

1930, inaugurou naquela casa de espetáculos o cinema sonoro no Recife, com o filme A divina dama.

1922


Cinema Brasil – Localizado  na Rua Imperial

Cinema São José – Cinema democrático no pátio do Mercado de São José.

1926


Cinema Glória – Na rua Direita, no Bairro de São José, o Cinema Glória fez sucesso com suas sessões da tarde

Outros Cinemas:

O Veneza, Astor e o Ritz tiveram salas de cinemas que ainda foram freqüentadas pela nova geração de adultos da cidade. O fechamento desses cinemas deixaram a população com o São Luiz, como uma alternativa mais popular.

 

 

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