Era 07 de julho de 1990, quando o Brasil recebeu a notícia que um dos maiores ícones do rock brasileiro havia falecido. Cazuza, aos 32 anos e com 10 de carreira, deixou uma herança de 126 músicas, sendo 34 gravadas por outros intérpretes e mais de 60 inéditas. Número de parcerias? Incontáveis.
João Araújo, pai de Cazuza não esperava que o filho se tornasse cantor, já que as opções eram assessor de imprensa, fotógrafo e até ator. “Fui talvez o último a saber do talento de Cazuza. Também nunca tinha ouvido ele cantar em casa e por isso me surpreendi quando o vi cantando Edelweiss num espetáculo. Era tudo muito ruim, o som era de garagem, mas senti que ali naquele palco havia algo mais que um menino curioso para trabalhar com música”, enfatiza João no livro Preciso dizer que te amo – São Paulo:Globo,2001.
Cazuza Ainda bebê com o pai João Araújo
A carreira musical do poeta surgiu primeiramente com Léo Jaime que apresentou Caju, conhecido assim pelos mais íntimos, para a banda Barão Vermelho. O som era escrachado, de garagem, típico da vibe dos anos 80, onde o Brasil estava desacreditado, chegando ao fim da ditadura e partindo para um caminho democrático sem volta. O país precisava de alguém com pulso firme, que mostrasse sua cara. Assim, surgiu o artista burguês, mas não sozinho.
Zeca e Caju: uma relação de sinergia onde o tempo não pára
O santo protetor que ajudou a alavancar o sucesso da banda Barão Vermelho se chamava Zeca Jagger, vulgo Ezequiel Neves; jornalista, crítico, produtor musical, amante dos Rolling stonnes e diretor de esporros em geral, como Caju costumava dizer.
A primeira vez que escutou a fita do grupo, Zeca fez o maior escândalo para convencer o Guto Graça Mello, então diretor artístico da empresa, a gravar o disco. Guto ficou impressionado com a agressividade do Barão e topou gravar o primeiro LP homônino da banda.
O lançamento do disco foi tímido, tendo apenas 8 mil cópias vendidas. Segundo Cazuza, a gravação durou 48 horas e o som do estúdio acentuava sua língua presa. A primeira música do primeiro disco do Barão já começava enfática e direta como o astro sempre foi: “Pouco importa o que essa gente vá falar mal. Falem mal! Eu já tô pra lá de rouco louco total!”
1984 – Zeca e Cazuza
(ouça aqui a música “Posando de star” a primeira música do primeiro LP do Barão Vermelho. Letra e música de Cazuza.)
Alguns shows pelo sul do país depois, o Barão volta para gravar seu segundo LP “Barão Vermelho 2”, onde o sucesso se consolidou com a regravação de Ney Matogrosso com a música “Pro dia nascer feliz” e depois Caetano Veloso com “Todo amor que houver nessa vida”.
Segundo Zeca, a banda reiventava o português de forma telegráfica, sem literatices ou metáforas vazias. “Só existe um disco tão agressivo quanto o de estréia do Barão: é o do Iggy Pop (cantor e compositor inglês), produzido pelo David Bowie”, declarou exageradamente.
A parceria de Zeca com Cazuza foi além do cenário musical. A prova maior é da mãe do cantor, Lucinha Araújo, que acreditava que o produtor não seria a melhor companhia para o filho. “A gente tinha uma relação de amor e ódio, porque achava que ele levaria Cazuza para o mau caminho. Depois vi que isso era uma bobagem. Ele teve grande importância na formação intelectual do meu filho. Apresentou Cazuza aos grandes poetas, teve muita responsabilidade sob esse aspecto. E os dois se davam muito bem”.
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1984 – Lucinha Araújo no Camarim com Caju.
Solidão, que nada
Em um futuro duvidoso, Zeca não abandonou Caju em nenhuma circunstância, até sua morte prematura em 1990, quando lutava contra o vírus da HIV. “Cazuza é um neto que eu não tive. Perguntam se a gente não brigava. Sim, brigava para fazer as pazes. Se brigamos 400 vezes, fizemos as pazes 1000 vezes”.
Irreverente como o cantor, Zeca acompanhou as filmagens do filme O tempo não pára (2004), baseado no livro de Lucinha, Só as mães são felizes e para o ator Emílio Melo, que o interpretou no cinema, ele só tinha uma coisa para dizer “desmunheca para fazer ou falar qualquer coisa minha, meu bem”.
Em 2005, Ezequiel Neves descobre que está com tumor do cérebro e em 2010 é internado por alguns meses, sob os cuidados do parceiro e amigo Roberto Frejat. Disparando contra o sol, sendo forte e por acaso, tenta a recuperação em casa e apelida o tumor de “tuninho”, sobrevivendo assim, sem um arranhão.
Mas como a vida é desconhecida e mágica, o tempo estava parando para o produtor. Sensitiva, Lucinha disparou para João (pai de Cazuza) “Acho que ele está esperando o dia 07 para encontrar Cazuza e homenagea-lo. E no dia 07 de julho de 2010, quando o Brasil comemorava o mês do rock mundial, ao mesmo tempo em que relembrava o aniversário de 20 anos da morte de Cazuza, morre aos 74 anos, Ezequiel Neves. “Agora deve está uma bagunça lá em cima. Deus está querendo se livrar deles. É capaz até deles voltarem para Terra”, dispara brincando.
Essa relação exagerada e enigmática só se (re)descobrirá em outras vidas, talvez. Nessa, o negócio é ir vivendo segredos de liquidificador e sonhar acordado, num jeito de não sentir dor.
1987 – Pose para o Jornal Folha de São Paulo
CLICK REComendado:
CD do show do Teatro de Ipanema, onde foi gravado duas semanas após o cantor descobrir que estava com Aids. (O lançamento foi em 2005)
Veja aqui a notícia do Jornal Nacional sobre o sepultamento de Cazuza:
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