Uma pesquisa desenvolvida a partir do banco de dados da Vara de Violência Doméstica do Cabo de Santo Agostinho, no período entre 2016 e 2024, e publicada na Revista Eletrônica da Estácio Recife analisa o comportamento de agressores e busca compreender como se estabelece a dinâmica de dominação nas relações marcadas pela violência. O estudo é conduzido pelo psicólogo judiciário, Mozart Amorim, que atua há 12 anos no Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) e é professor do Centro Universitário UniFBV Wyden, onde coordena projetos de pesquisa sobre psicologia jurídica.
A investigação utiliza dados coletados em entrevistas de acolhimento realizadas com todas as mulheres que chegam à Vara para audiências desde 2016. No procedimento, as vítimas recebem orientação sobre a Lei Maria da Penha, esclarecimento de dúvidas sobre o processo, encaminhamentos à rede de atendimento e informações sobre o funcionamento das medidas protetivas. Dessa escuta, além do apoio prestado, é produzido um relatório que é anexado ao processo e alimenta uma base estatística anual sobre violência doméstica no município.
Segundo Amorim, ainda há pouca produção científica no país sobre a compreensão psicológica do agressor, o que torna a pesquisa inédita no contexto local. “Existem poucas pesquisas publicadas sobre violência doméstica e menos ainda sobre o comportamento dos agressores. O foco foi tentar entender como eles subjugam as vítimas, a partir dos relatos das próprias mulheres”, explica o pesquisador.
A análise dos dados permitiu identificar padrões de conduta, especialmente relacionados ao controle emocional, psicológico e econômico que muitos agressores exercem ao longo do tempo. “A pesquisa gerou quadros sobre os comportamentos que cada tipo de agressor realiza, como também sua aderência ou não às medidas protetivas expedidas pelo juiz. É uma pesquisa inicial e ainda precisamos aprofundar mais nos dados para tornar mais claros os detalhes das atitudes dos agressores”, afirma.
Além de sustentar estudos, o atendimento pré-audiência cumpre papel fundamental na proteção da vítima. Caso seja identificado descumprimento das medidas protetivas, essa informação é comunicada imediatamente ao juiz da Vara. “A entrevista de acolhimento auxilia a vítima em vários fatores, pois esclarece dúvidas sobre o processo e orienta sobre o que fazer se o agressor descumprir as medidas. Quando isso acontece, o juiz pode determinar a prisão do acusado ou instalar tornozeleira eletrônica, para melhorar a segurança da vítima”, ressalta Amorim.
Os dados mostram aumento anual no número de casos registrados na Vara. Porém, o pesquisador alerta que isso não significa, necessariamente, aumento da violência em si. “O número de vítimas está aumentando a cada ano, mas não dá para afirmar que a violência aumentou. Acreditamos que o que aumentou foi a conscientização das vítimas para realizar a queixa na delegacia e iniciar um processo judicial para cessar as violências”, destaca.
A pesquisa segue em expansão por meio de projetos PIBIC desenvolvidos no Centro Universitário UniFBV Wyden. As próximas etapas investigam o impacto psicológico prolongado da violência, bem como a influência da dependência econômica e das condições sociais na permanência das vítimas em relacionamentos abusivos. “Existe um número elevado de vítimas que registra a primeira queixa somente após anos de sofrimento. Esse é um ponto central, porque a violência doméstica deixa sequelas pesadas não só nas vítimas, mas também em seus filhos e demais familiares”, conclui o pesquisador. “Novas publicações estão previstas para 2026, aprofundando o estudo das variáveis emocionais, socioeconômicas e comportamentais que estruturam a violência doméstica”, finaliza.
*Via Assessoria