As motivações Biográficas como Matéria- prima para a prosa de Clarice Lispector

 

 

A Literatura, assim como qualquer outro tipo de arte, tem como objetivo principal sensibilizar, ou seja, provocar no leitor prazer estético,uma vez que o artista possui um modo especial de captar a realidade que o cerca, enquadrando-a dentro de certos paradigmas, para , desse modo,engendrar a forma de expressão que irá caracterizar a sua obra.

 

 

A Literatura, assim como qualquer outro tipo de arte, tem como objetivo principal sensibilizar, ou seja, provocar no leitor prazer estético,uma vez que o artista possui um modo especial de captar a realidade que o cerca, enquadrando-a dentro de certos paradigmas, para , desse modo,engendrar a forma de expressão que irá caracterizar a sua obra.

 

 

É, tendo em vista tal perspectiva, que pode-se dizer que a biografia de Clarice Lispector, intitulada Clarice, cuja autoria pertence ao historiador norte-americano, Benjamin Moser, deve ser considerada um livro no qual é possível conhecer a realidade em que viveu a escritora e como ela soube utilizar os acontecimentos que cercaram a sua vida particular como matéria- prima para criar sua própria linguagem.

Nos capítulos iniciais do livro, mais precisamente nos sete primeiros capítulos, Benjamin Moser traça um paralelo histórico que vai desde antes do nascimento de Clarice, quando a família ainda se encontrava na Ucrânia, até a chega da  mesma ao Nordeste do Brasil. Assim,o autor busca situar os acontecimentos que marcariam a vida desse grupo e, por conseqüência, o caráter da escritora, que era a mais nova de três irmãs.Muito embora essa contextualização histórica seja um tanto mais intensa nos capítulos iniciais da biografia, vale salientar que tal detalhamento será um recurso recorrente em quase todos os capítulos do livro.

Um outro recurso também muito recorrente no livro e que, desse modo, merece ser pontuado, é o fato de que, em determinadas passagens, Moser utiliza fragmentos extraídos da prosa de Clarice para construir o ethos da escritora. Ou seja, os acontecimentos que cercaram a vida da autora são, muitas vezes, ilustrados a partir de trechos de suas narrativas,deixando claro, conforme atestou a própria Clarice que sua inspiração não vinha do sobrenatural, mas de uma elaboração inconsciente, que aflorava à superfície como uma espécie de revelação.

A biografia também deixa claro que a formação da Clarice escritora se dá já na infância quando a menina criava estórias nas quais uma força mágica salvava sua mãe, que segundo as palavras de Moser, padecia de sífilis, doença que adquiriu ainda na Ucrânia,possivelmente após ser vítima de um estupro.É, nesse contexto, que conforme sugere o livro em questão, pode-se estabelecer um diálogo, entre a prosa de Lispector e a presença do místico como fator de redenção presente em narrativas judaicas. Vale salientar que a escritora provinha de uma família judia, muito embora, em determinadas situações, o leitor venha a se deparar com uma Clarice que questiona a existência de Deus.

Uma outra informação do livro que merece destaque é o fato de que, ao contrário do que podem pensar certas pessoas, Clarice Lispector não foi completamente alheia à realidade social que a cercava, muito pelo contrário.Após a instauração do Regime Militar no Brasil, que teve início a partir do chamado Golpe de 64, principalmente após os anos em que essa ditadura tornou-se mais rígida, a escritora,assim como outros artistas de seu tempo, foi às ruas protestar contra o regime, participando da Passeata dos Cem Mil,que aconteceu em junho de 1968 no Rio de Janeiro.Ainda dentro desse contexto, o biografia faz referência ao cancelamento da noite de autógrafos de A mulher que matou os peixes em protesto ao exílio a que  Gilberto Gil, Caetano Veloso e Chico Buarque foram submetidos pela Ditadura.

Em suma, é possível observar que em seu livro Benjamin Moser demonstra que as experiências vivenciadas por Clarice serviram como matéria- prima para configurar a sua forma de expressão artística. Dessa maneira, fica claro que suas inspirações, que, de acordo com a própria autora provinham de seu íntimo, juntamente com sua capacidade de transformar em linguagem suas emoções, são os elementos essenciais que fizeram com que sua prosa se colocasse como um divisor de águas na literatura brasileira.